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16 agosto 2011

Coisas que aprendo com a crise - 4

Com a crise aprendo a ser compassivo, justamente por ficar mais sensível à condição humana, com as suas contingências e incertezas. Quando enfrento momentos de crise na minha vida, aprendo que as coisas más acontecem também a pessoas boas. Nem sempre uma pessoa fica desempregada ou perde o seu negócio por ser preguiçosa ou por não ter sido empenhada e diligente. Nem sempre uma pessoa fica com dívidas por ter sido imprudente e gasto mais do que deveria. Nem sempre uma relação (casamento, namoro, amizade) termina porque uma pessoa falhou. Simplesmente, as coisas ruins acontecem e acontecem-nos, também. Gostaríamos que fosse diferente, que tivéssemos uma espécie de salvo-conduto para atravessar o deserto da existência sem problemas. Ao passar por situações ruins, sem que tivesse moralmente contribuído para tal, aprendo a olhar para o que sofre, com compaixão. Torno-me mais sensível ao sofrimento e à luta do meu próximo. Na verdade, é por passar também por momentos maus, por, nalguns momentos da minha existência, ter sido também um "homem de dores", é que posso abrir-me à dor do outro e tornar-me próximo para ele, dando-lhe a minha compaixão, tanto em palavras de conforto e de encorajamento, como em actos concretos de ajuda. Se permitirmos, a actual crise poderá ajudar-nos a sermos pessoas mais compassivas e solidárias, menos egoístas e mais abertas ao outro, ao nosso próximo. Jesus foi o homem e o Mestre cheio de compaixão, como diz o Evangelho, justamente por ter sido também o "homem de dores, experimentado nos trabalhos".

03 agosto 2011

Coisas que aprendo com a crise - 3

Com a crise aprendo a nunca desistir. Por vezes, essa é a vontade. Desistir de lutar, de sonhar, de acreditar, de seguir adiante. Baixar os braços, render-se às evidências, soçobrar diante da força dos ventos contrários. Apetece desistir quando os motivos para acreditar em dias melhores não abundam, quando parece não haver mais lugar para a esperança autêntica. Sim, apetece desistir. Não se trata de cobardia. Ouvimos histórias de pessoas que ficaram pelo caminho. Cruzamo-nos com muitos que ficaram lançados à beira do caminho da história e do progresso, mendigando a caridade alheia. Conhecemos muitos que entraram em bancarrota emocional diante dos revezes. Sabemos disso tudo e perguntamo-nos: serei diferente?, o que faz de mim uma pessoa diferente destes outros?, como saberei eu que vou vencer, que haverá algures uma saída? É verdade, não sabemos. Aqui não se trata de uma ciência. Não existem predições. Apenas uma coisa sei: não posso e não quero desistir. Não tenho o direito de baixar os braços, de deixar de acreditar e de lutar. Tenho que seguir adiante, custe o que custar. Ocorre-me então as palavras do salmista, quando ele fala dos que levam a preciosa semente chorando, mas que voltarão trazendo os seus molhes. Sim, por vezes, é chorando que uma pessoa leva a preciosa semente dos seus sonhos, das suas expectativas, das suas esperanças. Mas, um dia, essas sementes lançadas no meio de tanta adversidade e dor, darão os seus frutos, produzirão a sua colheita de alegria. Por isso, não posso desistir, nunca! Fui criado por Deus para enfrentar as tempestades e resistir aos ventos contrários. É quando descubro que, afinal, sou mais forte do que pensava; que tenho recursos que nem sequer suspeitava; que há uma presença divina que me acompanha, sustenta e guia. 

01 agosto 2011

Coisas que aprendo com a crise - 2

Com a crise aprendo a ser flexível. Esta não é uma das minhas qualidades, nem possivelmente a de muitos, particularmente quando somos pessoas de convicções e determinados a alcançar aquilo em que acreditamos. Gostamos de seguir a rota e atingir os objectivos que estabelecemos previamente. Não nos importamos de contornar os obstáculos nem de forcejar as montanhas que surgem no nosso caminho. Normalmente, não temos problemas em rever-nos nas palavras de Jesus que todo o que acreditar poderá dizer às montanhas (obstáculos, oposição, resistências) que saiam do nosso caminho, e isso acontecerá. Quando surgem as crises existenciais ou enfrentamos crises económicas e sociais, como a que vivemos actualmente, as coisas mudam de figura. De repente, damo-nos conta que por mais fortes que sejamos, a crise que está diante de nós não pode ser contornada nem confrontada. Terá que ser vivida. Vamos ter que passar por ela, gostemos ou não, queiramos ou não. Em tempos de crise, tornamo-nos aprendizes da flexibilidade, dessa arte de saber encontrar novos caminhos, abrindo mão dos caminhos antigos, novas soluções, tendo a coragem de largar aquelas em que acreditávamos e julgávamos as melhores. Aprendemos a gerir melhor os nossos relacionamentos, pessoais e profissionais. Agora, esta é uma dança em que nem sempre somos nós o elemento que conduz a dança. Aprendemos a ser flexíveis na gestão do nosso tempo, assim como das nossas responsabilidades pessoais, familiares e profissionais. Os horários nem sempre são estáveis e certos. Há um certo caos que se instala no dia-a-dia e para o qual precisamos de uma certa flexibilidade para gerir e saber traçar uma rota que nos ajude a chegar a algum lado. Temos que saber ser flexíveis em relação às nossas expectativas. Os tempos e as condições agora são outros. Por vezes, continuamos a manter as expectativas que tínhamos antes dos tempos de crise. O que só faz com que a frustração se apodere de nós, ou, se não for esta, o entregamo-nos ao escape da fantasia. Flexibilidade é, sem dúvida, uma das coisas que aprendo a cultivar e a usar nos tempos de crise, como este.